“Tudo Bem ser Diferente”

Conheci “Tudo Bem ser Diferente”, escrito e ilustrado pelo californiano Todd Parr, por indicação de um atendente de uma livraria na qual eu contava histórias, durante um dos meus intermináveis “garimpos” pela loja. “Esse livro é bem bonito! Apareceu outro dia na novela.” Confesso que não acompanhava a tal novela, mas me encantei pela obra lançada no Brasil em 2008 pela Panda Books.

O livro de 32 páginas é mesmo uma graça e faz parte de uma série de livros no mesmo estilo lançados pelo autor, todos pela Panda Books. Os pequenos leitores, pequenos mesmo, da primeira infância que compreende dos 0 aos 5 anos, costumam gostar muito da obra. Pude comprovar isso nos anos que trabalhei como Contadora de Histórias na tal livraria onde encontrei o livro e mais tarde, através do interesse da Lara, minha sobrinha, hoje com pouco mais de dois anos e meio.

E eu explico. A obra é mesmo toda pensada para esse público: o livro é grande, as páginas em cores diferentes e vibrantes, o texto verbal todo escrito em caixa alta e as ilustrações (do escritor) com traços simples e cores vibrantes que fazem uma harmoniosa composição visual. Além disso, os temas abordados por Todd, são sempre interessantes e relevantes para o público a que se destina.

Em “Tudo Bem ser Diferente”, Todd trata da diversidade de modo amplo e irrestrito, como aliás, somos todos, no que tange a gênero, etnia, cultura, constituição familiar, religião e crenças, gostos, condições físicas e/ou intelectuais. O livro aborda o tema de maneira leve, envolvente e rápida. Há pouco texto verbal em cada página. Apenas o suficiente para prender a, às vezes pouca atenção, dos pequenos leitores, afinal geralmente, quanto menor a criança, menos seu tempo de concentração.

Por que ler?

Porque o livro tem toda uma proposta gráfica voltada para o público da primeira infância. Porque a temática é bastante relevante. Porque é um obra visualmente interessante Porque parte dos direitos autorais e dos valores da venda do livro foram doados pelo autor e pela Editora Panda Books para a Associação Pró-Hope Apoio à Criança com Câncer, com sede em São Paulo/SP. Porque já na primeira infância se pode começar a estimular nos pequenos o gosto e o habito pela leitura. 

Desejo que a criança que ouvir essa história se identifique e se divirta tanto quanto eu sempre me diverti mediando a leitura!

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“Redemoinho em dia Quente”

Eu estava em Curitiba/PR.  Não lembro se tinha ido para algum curso ou se simplesmente estava passeando por lá. Antes da pandemia, não era raro que em dia de folga das contações de histórias, eu pegasse um ônibus na rodoviária de Joinville/SC e fosse até Curitiba, apenas para passar o dia. O fato é que eu estava em Curitiba e, antes de voltar a Joinville, passei em um shopping para um lanche rápido e, é claro, visitar a livraria.

Procurava por “Insubmissas Lágrimas de Mulheres”, de Conceição Evaristo (logo, logo vou escrever sobre ele também), mas a loja não dispunha de nenhum exemplar do livro. A atendente, muito simpática, quis encomendar o livro pra mim. “Ah, não moro aqui. Não tem problema, era só se você tivesse mesmo. Obrigada!” “Olha, moça! Esse da Conceição eu não tenho, mas você já leu Jarid Arraes? “ “Não!” “Nossa, você tem que conhecer! “Redemoinho em dia Quente”, é incrível!”

Trouxe esse e outro de literatura infantil. Na saída ainda procurei o gerente da loja e elogiei o bom atendimento dela.

Bom, a atendente me convenceu a trazer o livro, e ainda no shopping dei uma espiadinha nele, já encanta pela capa.

O livro, lançado em 2019 pela editora Alfaguara, conta com 30 contos divididos em 128 páginas bem escritas por Jarid, cearense de Juazeiro do Norte, mas conhecida como cordelista. Estreando como contista em “Redemoinho…”, Jarid revela uma escrita sensível e ao mesmo tempo forte, e a orelha do livro é escrita por ninguém menos que Maria Valéria Rezende. Jarid Arraes é certamente um importante nome da literatura brasileira da atualidade: mulher jovem, negra, consciente do seu “lugar no mundo”, em “Redemoinho em Dia Quente”, Jarid diz a que veio.

Voltei para Joinville lendo no ônibus sob a fraca luz da lanterna do próprio ônibus, sem me cansar. Seus textos são fluidos e impactantes.

Por que ler?

“Redemoinho em Dia Quente”, é um livro de contos de autora brasileira, negra, feminista, jovem, com textos que nos levam do riso às lágrimas, porque foi assim, em lágrimas que terminei, por exemplo, a leitura do conto “Cachorro de Quintal”, mesmo sem ter e nem nunca ter tido um cachorro.

A linguagem ora suave ora ácida, em textos curtos, prende a atenção do leitor do início ao fim. 

Recomendo para leitores adultos de sensível e corajoso coração!

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“O Primeiro Amor e Outros Perigos”,

“O Primeiro Amor e Outros Perigos”, do paulista Marçal Aquino, foi lançado em 1997 pela Editora Ática e integra a muito conhecida, Série Vaga-Lume que marcou gerações de jovens leitores em todo o país. O livro, que é literatura infantojuvenil narra a história de três adolescentes, Vinicius, Bianca e Fernando que são amigos, estudam juntos e juntos escrevem o Jornal Agora, que circula entre os alunos do Colégio Paulo Ferreira.

Bianca e Fernando são namorados, para a tristeza de Vinicius que é secretamente apaixonado pela amiga, mas por ser muito tímido, nunca conseguiu se declarar a ela. Tudo corria bem, até que um crime abala a pacata cidade: o professor Eusébio, “padrinho intelectual” do Jornal Agora é encontrado morto em seu casarão. Ainda sob o impacto da notícia, Bianca, Fernando e Vinicius decidem que não ficarão de braços cruzados esperando que a polícia resolva o caso, e que às escondidas farão uma investigação por conta própria. Os três, naturalmente, se envolvem em uma perigosa aventura. Paralelo a isso, alguém passa a produzir anonimamente a “Coluna do Sombra” para o Jornal Agora. Nessa coluna, o anônimo escritor passa a relatar sua visão sobre cada aluno dos diferentes grupos do Colégio Paulo Ferreira. É quase uma coluna-fofoca, mas isso dá a trama mais uma vez um caráter investigativo, afinal, quem seria o Sombra?

A trama é muito bem urdida, assim como os outros títulos que o autor escreveu para a mesma série, “A Turma da Rua Quinze”, “O Jogo do Camaleão” e “O Mistério da Cidade- Fantasma”, e prende a atenção do leitor do início ao fim.

Por que ler a obra?

Porque é literatura infantojuvenil da melhor qualidade. Com linguagem acessível, voltada ao público a que se destina, a história se desenrola de maneira leve e instigante. Para os jovens leitores, é a possibilidade de um primeiro encontro com um autor sensacional e uma série que é um clássico na nossa literatura. Para os leitores mais experientes e, porque não?, mais velhos, é a possibilidade de um nostálgico reencontro com uma obra ágil e de rápida leitura, em que romance e aventura se misturam na dose certa. Será que Vinicius conseguirá se declarar e assim conquistar o coração de Bianca? Conseguirão os três descobrir o assassino do professor Eusébio? E mais, por que alguém desejaria matar um professor que nunca teve inimigos? Quem será o Sombra?

 Recomendo a leitura!

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“Anexos”

“Anexos”, foi lançado em 2014 pela norte-americana Rainbow Rowell, e aqui no Brasil, publicado pela Novo Século Editora. O livro de 366 páginas narra a divertida história de Lincon.

Ele acaba de ser contratado por uma revista com a finalidade de ler os e-mails dos funcionários. Isso mesmo. Todos na redação sabem que há alguém lendo os e-mails trocados entre eles, mas ninguém sabe quem é o “espião”. Há uma norma na revista que proíbe a troca de e-mails de cunho pessoal, daí a existência do tal espião. Lincon, anda frustrado com seu novo trabalho, mas afinal, foi a única coisa que apareceu em meses, e ele não pode se recusar a realizar tal função.

É nesta função que Lincon começa a ler os e-mails trocados por Beth e Jennifer. Ele sabe que deveria denunciá-las, mas começa a se divertir com o teor das conversar das duas nos e-mails e não consegue deixar de se cativar pelas histórias das duas. Quando, afinal, ele percebe que está se envolvendo por uma delas, é tarde demais para se apresentar, afinal o que ele diria…?

“Anexos” é um romance clichê, daqueles bem ao estilo comédia romântica que a gente já sabe o que vai acontecer, mas não consegue largar a leitura (tal qual nosso protagonista com os e-mails de Beth e Jennifer). Por que ler?

Este livro esteve na minha “lista dos desejos” por algum tempo, de tanto ouvir e ler indicações nos canais literários e, realmente, valeu a pena a aquisição. Trata-se de um romance leve, de leitura fluida, o famoso chick-lit, mas com a história narrada à partir da ótica do protagonista masculino. Ótimo para os momentos de “ressaca literária”, quando parece que nenhuma leitura “engrena”.

Apesar de atualmente, utilizarmos recursos ainda mais dinâmicos, como boa parte da história se passa com Lincon lendo os e-mails, a diagramação dos textos torna a leitura ainda mais rápida. E, por último, mas não menos importante, o romance é fofo!
Daqueles que nos fazem sentir o coração quentinho.

Recomendo para apaixonados leitores!!!!

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“A Palavra que Resta”

A obra que apresento nesse texto “cheira a novo”. “A Palavra que Resta” é o livro de estreia do cearense Stênio Gardel e teve seu lançamento online, em meio a pandemia no primeiro semestre de 2021. Publicado pela Editora Companhia das Letras suas (apenas) 152 páginas nos enganam. Pedi recomendação a um grupo de amigos. Queria algo que tratasse de relacionamento LGBTQIA+ para indicar por aqui no mês de Junho (mês do orgulho LGBTQIA+) e recebi a foto da capa do livro pelo grupo de WhatsApp com a recomendação: “É muito bom!”

Imaginei que fosse mesmo, por ter sido indicado por amigo leitor, por ser uma edição da Companhia das Letras, mas confesso, que “julguei o livro pelo número de páginas”. Quando o adquiri pensei: “Que bom! Vou ler rapidinho!”, mas o que ocorreu foi que o enredo, a linguagem, a temática, tudo me arrebatou de tal modo que não consegui “ler rapidamente”. “A Palavra que Resta” narra a história de Raimundo, homem analfabeto que na juventude teve um romance proibido violentamente interrompido. Raimundo vê-se obrigado a partir para o mundo, mas leva consigo sua relíquia: uma carta nunca lida, guardada por mais de meio século.

O que teria Cícero escrito naquela carta? Raimundo não podia decifrar e, como também não queria permitir que outra pessoa a lesse, nunca ficou sabendo. O tempo passa e a história se desenrola entre memória e tempo real até que, aos 71 anos, ele finalmente decide que ainda é tempo de aprender a ler e escrever para finalmente saber o que Cícero lhe dizia na tal carta. Mas o medo mais uma vez o assombrava: e se ele, àquela altura da vida, depois de ter passado por tudo o que passou, medo, preconceito, vergonha, descobrisse finalmente que poderia ter sido tudo diferente, tudo melhor? Em meio a esse conflito, e tantos outros, “A Palavra que Resta”, nos toma de assalto por sua força, por sua coragem, por sua beleza. Uma obra ao mesmo tempo delicada e dolorosa, escrita para ser degustada, saboreada a cada capítulo por corajosos e sensíveis leitores

Ainda em tempo, “A Palavra que Resta”, apesar de narrar a história de jovens descobrindo o amor, possui conteúdo adulto.
Tenho certeza de que você também será cativado por Raimundo, Cícero, Marcinha, Suzzanný e tantas andanças, reviravoltas, memórias, incertezas…por tanta vida.

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Evento online institui a fundação da Cinemateca de Joinville

No dia 19 de junho, comemora-se o “Dia do Cinema Brasileiro”, mas para a cidade de Joinville/SC, a data tornou-se ainda mais importante, pois foi escolhida como data de fundação da Cinemateca de Joinville.

O evento, realizado em formato online, contou com a votação do estatuto da entidade, que é sem fins lucrativos e independente, além também da eleição da primeira chapa diretora, “Tempo de Cinema”. A iniciativa de criar a Cinemateca de Joinville, nasceu de discussões e problematizações de acadêmicos, graduados na primeira turma de bacharel em Cinema e Audiovisual na cidade. Os estudantes questionavam sobre a importância de preservar a memória audiovisual joinvilense, e também a necessidade de contribuir com formação de público, principalmente através da educação patrimonial.

A Cinemateca têm como diretoria: Walmer Bittencourt Júnior, Fahya Kury Cassins, Scheila Alexsandra Pereira, José Henrique Wiemes e Marcelo Eduvirge. A chapa eleita acredita que é preciso pensar no desenvolvimento do setor audiovisual local, na formação de público e dos profissionais do setor. Para o grupo, é essencial preservar a memória, o patrimônio e as produções audiovisuais, ferramentas importantes para o desenvolvimento social e humano de sujeitos mais críticos e políticos.

Sobre a diretoria

“Tempo de Cinema”, a chapa fundadora é composta por:

Walmer Bittencourt Junior: Diretor presidente; graduado em Cinema e Audiovisual, pesquisador, co-criador do site Arte na Cuca, suplente da setorial de Cinema e Audiovisual (CMPC Joinville), membro da COA do Prêmio Catarinense de Cinema 2020.

Fahya Kury Cassins: Diretora de Comunicação e de Educação e Formação; graduada em Cinema e vídeo, professora no curso de Cinema e Audiovisual da UNISOCIESC, produtora e roteirista.

Scheila Alexsandra Pereira: Diretora Financeira; graduada em Cinema e Audiovisual, diretora do Cineclube Verberena, criadora do podcast Mulheres na Direção, cantora e compositora.

José Henrique Wiemes: Diretor Executivo; graduado em Cinema e Audiovisual, produtor.

Marcelo Eduvirge: Conselho Fiscal E Ético; graduado em Cinema e Audiovisual; criador do projeto “Mostra sua cara”, editor e roteirista.

Algumas das principais propostas da Cinemateca Joinvilense: Formação profissional e de público; Levantamento do acervo audiovisual localDifusão da cultura cinematográfica

Confira abaixo a assembleia de fundação, na íntegra:

O que é uma cinemateca?

Assim como em uma biblioteca, a cinemateca é responsável por guardar os registros, que nesse caso, são audiovisuais ao invés de livros. Seu objetivo é catalogar, promover parcerias públicas e privadas, formação e preservação do cinema, incentivar a produção cinematográfica e participar das discussões públicas sobre cinema e audiovisual.

Entre em contato com a Cinemateca de Joinville: @cinemateca | cinematecadejoinville@gmail.com

SERmulher: A produção artística de Rosi Costa

Ter contato com arte é essencial para quem escolheu ser educadora, aliás, deveria ser para todas as profissões. Discutir sobre arte, processos de criação e materiais, com quem é artista, nos auxilia na criação de repertório para exercer nosso trabalho, seja em sala de aula ou em espaços de educação não formal.

Considero um privilégio ter contato com artistas de Joinville e região, e assim aprender, trocar ideias, evoluir. E por falar em arte joinvilense e troca de ideias, no dia 18 de fevereiro fui convidada para conhecer um pouco mais sobre as pesquisas e trabalhos da artista visual Rosi Costa, que desenvolve suas pesquisas e trabalhos abordando a mulher e seu papel na sociedade. Fiquei surpresa com a quantidade de projetos, estudos, trabalhos, materiais e principalmente, a determinação e brilho no olhar com que ela aposta na arte e seu poder de transformação social.

Rosi é daquelas mulheres com conhecimento de causa e que busca por meio de sua arte autobiográfica, instigar a sociedade a refletir sobre o modelo patriarcal ainda muito presente nos lares brasileiros. Embora cada vez mais as mulheres estejam mostrando sua força e conquistando novos espaços, ainda é preciso quebrar muitas barreiras. Há um longo caminho até conseguirmos o tão sonhado reconhecimento, seguidos pela igualdade de direitos e elaboração de políticas públicas que respeitem as nossas necessidades e escolhas.

E tem jeito melhor de propor questionamentos e reflexões, do que por meio da arte? É esse o papel da arte conceitual – foco da pesquisa e produção da artista. Em seu gabinete de curiosidades particular, ela apresenta trabalhos dos mais antigos aos mais recentes, que aguardam o momento mais oportuno para entrar em contato com o público. Produzidos a partir de diversas linguagens como fotografia, registro de performances e principalmente objetos, Rosi Costa apropria-se de peças de roupa, caixas de remédio, sapatos e bolsas, conferindo a eles a condição de arte.

Com diversas possibilidades de leituras, vem tentando desconstruir a ideia da mulher perfeita, que cuida do lar, precisa ter e ser responsável pela educação dos filhos, da mulher que sofre e aceita a violência física e psicológica de diferentes autores, submissa. Se tivermos que definir essa mulher, poderíamos supor que é quase sempre aquela que concorda com a premissa de que “menina veste rosa e menino veste azul”.

A bolsa é o objeto de destaque em sua poética – a ponto de se tornar quase uma obsessão – algo que para ela, possui um forte poder simbólico, como a sensação de segurança e conforto. Em muitos trabalhos é possível pensar na bolsa como extensão do corpo da mulher e a peça que mais sustenta a hipótese de se tratar de uma representação da própria artista. Outro ponto que merece atenção, é o uso das cores vermelho e preto, que tem presença constante em sua produção, funcionando como uma espécie de dualidade, realidades/personalidades opostas em uma quer chamar a atenção enquanto a outra se reprime no anonimato.

Em um desdobramento de seus estudos, a autora levou para exposição coletiva Além do 9×12, realizada na Associação de Artistas Plásticos de Joinville – AAPLAJ, a fotografia e a apropriação de objetos, que resultaram no trabalho intitulado “Domesticação”, de 2016. Em seu processo de criação, homenageia mulheres dos séculos XV e XVI proibidas de exercer a arte como profissão, além de discutir temas como as ditas “obrigações” femininas. Muitos séculos depois, as obrigações parecem continuar as mesmas, provocadas por situações que levam ao auto julgamento, enclausuramento emocional e a perpetuação dos paradigmas impostos às meninas e mulheres ocidentais desde a Grécia Antiga.


“Domesticação” é um grito de protesto e ao mesmo tempo um chamado que se estende as outras mulheres que de alguma forma, passam por momentos de dor, opressão, medo e tortura – seja ela física ou psicológica – e que anseiam por um olhar crítico, mas ao mesmo tempo, afetuoso, e que desperte a empatia acima do julgamento.

Rosi Costa também fala de um passado que traz consequências para o presente. Mesmo vivendo em tempos de internet, redes sociais, sororidade e feminismo, nossos desejos e sonhos ainda são ceifados por nosso pai, companheiro, filhos, amigos e tantas outras pessoas que desconhecem ou que são apenas mais um reprodutor de conceitos e valores ultrapassados.

Até mesmo as próprias mulheres, que por questões culturais, ajudam a perpetuar regras que colocam suas filhas em condição de ser indefeso, recatada, dotada de habilidades ditas exclusivas das mulheres dos anos 50.

Muitas pagam e outras ainda vão pagar pela lavagem cerebral da década de 50, momento em que cuidar das necessidades do marido era considerado cumprir com o seu papel. Estar sexualmente sempre disposta, manter a etiqueta, os bons costumes e se auto sabotar era sinônimo de felicidade no casamento. A tortura social psicológica calou e reprimiu quem já não tinha forças para gritar, fazendo com que mães solteiras, divorciadas, pioneiras e homossexuais fossem vistas com desprezo e preconceito.

A mulher contemporânea estuda, trabalha, é mãe solo, dirige, bebe e faz sexo no primeiro encontro, mas ainda assim precisa constantemente enfrentar os desafios e assumir as consequências de suas escolhas, o que torna a vida muito mais difícil e cansativa. Mas é no do dia a dia, na conquista do diploma e da profissão, donas de nosso próprio corpo e falando em alto e bom tom a palavra NÃO, que eu ainda me pergunto: Quanto nós temos das crenças de quem nos criou? Como isso afeta nossa vida, e a dos que estão a nossa volta? O Quanto reprimimos nossos desejos em nome da família, do trabalho e do julgamento de outras pessoas? Quanto de “Domesticação” habita em nós?

São algumas das reflexões que o trabalho da artista nos provoca e que convido você leitor ou leitora, a pensar e discutir com outras mulheres, parceiros, família e grupos sociais. Somente por meio do diálogo será possível desconstruir os padrões e amenizar o preconceito quando o tema é a mulher na sociedade.

O Carnaval joinvilense e a falta de investimento em cultura

Quando comecei a pensar sobre um texto de opinião a respeito do carnaval joinvilense, a primeira intenção foi procurar quem faz a festa acontecer, ou seja, organizadores, produtores culturais e grupos carnavalescos, além do desejo de despertar algumas boas memórias em quem sempre gostou de participar da folia.

Entretanto, para realizar a pesquisa era preciso entrar em contato com produtores ou pessoas que se destacam quando o assunto é carnaval em Joinville. Começo minha busca contatando alguns nomes, na esperança de que ao menos um deles contribuísse com falas e curiosidades, no que diz respeito à criação do(s) grupo(s) carnavalesco(s), preparação, organização do evento, e principalmente a pergunta de meu maior interesse: o que o carnaval representa para você?

Infelizmente ou felizmente, consegui contatar alguns produtores, integrante de escola de samba e até um pesquisador da área, porém todas as então “personalidades”, não sabiam ou não estavam dispostas para conversar naquele momento. E foi de conversa em conversa, que todos me encaminhavam a outro e outro e mais outro contato, sempre sem disponibilidade para responder com clareza minhas perguntas.

Após algumas tentativas, frustrada e com o carnaval da cidade batendo na porta, decidi abordar o tema em outra oportunidade. Mas que surpresa a minha, quando no dia seguinte, ao ler um dos jornais local, soube que a primeira noite (22/02) de apresentação e celebração de uma das manifestações culturais mais esperadas no Brasil, termina não com alegria e sentimento de dever cumprido, mas sim em pancadaria, bombas de efeito moral e tiros disparados pela polícia.

Falta de organização da festa? Despreparo da polícia? Uma fatalidade? Lugar certo, pessoas erradas? Acredito que os fatos ainda serão apurados, porém o prejuízo sempre vai ser da população. Triste mesmo é saber que não foi apenas um caso isolado, no segundo dia de comemoração (23), durante a apresentação do grupo de maracatu Morro do Ouro, na Rua das Palmeiras, centro de Joinville, presenciei a outra confusão, que foi motivo para pânico e correria. A acusação de que uma mulher havia roubado um grupo de foliões, causou o estopim da briga. Desta vez sem policiamento, puxões de cabelo, empurrões, socos, chutes e garrafas quebradas assustaram quem se divertia.

O clima era de indignação, muitos gritavam “BRIGA NÃO”, mas o resultado foi outra noite marcada pela brutalidade humana.
São esses episódios – não muito diferentes do que acontece em outros carnavais de rua pelo país afora – é que me fazem refletir sobre como estamos sedentos de cultura, seja no centro ou na periferia.

É preciso com urgência, sensibilizar as pessoas, ampliar o acesso às artes, à educação e passo a passo, ir construindo por meio dessas ferramentas, o pensamento crítico para uma cultura de paz. O que presenciamos ou a notícia que chegou até nós por meio dos jornais e comentários, é apenas o reflexo do quanto o país e o município vem sofrendo com o abandono, descaso e falta de respeito quando o assunto é cultura.

Quem vive da disseminação do sensível, precisa cada vez mais, buscar outras opções de trabalho que não o exercício da sua arte para poder sobreviver. A classe artística está desmotivada e cansada de viver só de esmolas. Cortes de verbas e um emaranhado de procedimentos burocráticos emperra a produção cultural, dificultando a participação e contemplação de projetos via leis de incentivos.

O desmonte, desmoronamento e fechamento de espaços culturais como a Cidadela Cultural Antarctica, só contribui com a violação dos nossos direitos garantidos pela constituição art. 125 “O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais”.

Com apenas mais um dos tantos direitos da população negligenciados, não saber festejar com responsabilidade e empatia é só a ponta do iceberg. O investimento precário por parte do governo, em arte e cultura influencia no que faz do humano, SER humano. Garantir o exercício dos direitos culturais não se trata apenas da produção de eventos ou vivências artísticas que contemplem apenas quem pode pagar por eles.

Boas peças de teatro, exposições, concertos, leituras entre outras possibilidades, e principalmente excelentes mediadores, podem contribuir no processo de desenvolvimento social, moral e ético da população, visto que, sem a emoção, experiência, encantamento, afeto e contaminação pela arte, não há sociedade que resista ao caos e a própria destruição.

O encontro da arte com a educação

Com curadoria pedagógica do Museu Bispo do Rosário (RJ) a mostra “O Grande Veleiro”, que está em exposição no Sesc Joinville até 27 de março, surpreende ao reorganizar a dinâmica das curadorias tradicionais, evidenciando o educativo que quase sempre, aparece em segundo plano no sistema da arte. Neste projeto a aposta está nos recursos pedagógicos, que recebem a condição de obras de arte, legitimadas pelo espaço expositivo.

É na experiência e interação do público, que o projeto curatorial faz todo sentido, sugerindo por meio de vídeos, imagens e objetos, novas conexões com a biografia e o trabalho do artista. Em destaque estão os jogos educativos como “A caixa dos escolhidos”, bordados e objetos propositalmente posicionados, que contribuem para a criação da atmosfera que nos aproxima do universo de Arthur Bispo do Rosário.

Intenção da curadoria ou não, as discussões presentes na mostra estão mais relacionadas a biografia do artista e a um conjunto de obras, do que aos conteúdos conceituais relacionados à elas. Mas “O Grande Veleiro” merece destaque pelas soluções interativas e convidativas que atraem leigos e iniciados, organizando um espaço democrático em que não é preciso ter conhecimentos prévios para poder aproveitar e aprender sobre arte, o mais importante é sentir e desfrutar da sua proximidade com a vida.

Aldeia Tekoa Tarumã: Resistência, força e Luta

“Dizem que os tempos da escravidão já acabaram, mas para o indígena continua o mesmo.”
Cacique Ademilson Moreira

Foto: Walmer Bitencourt Júnio. Na foto: Sr. Luiz (Rede Luz), Celiane Neitsch (Arte na Cuca), Cacique Ademilson e moradores da aldeia. Entrevista realizada em 2019 – antes da Pandemia Covid 19.

As margens da BR 101, adentrando por um caminho estreito e sem chamar muita atenção, no final de 2019 à equipe do Arte na Cuca, em conjunto com a fraternidade humanitária Rede Luz, visitou a aldeia indígena Guarani, Tekoa Tarumã, localizada na cidade de Araquari/SC. Ao todo 11 famílias habitam a região, lideradas pelo Cacique Ademilson Moreira, que de fala mansa e agradável nos recebe na casa de reza, local sagrado para a cultura Guaraní.
A impressão foi de que lá, a vida passa mais devagar, e de que existe o tempo certo para cada coisa. O tempo de falar, de ouvir, de orar e também o tempo de esperar. Algo quase inimaginável no mundo ansioso e doente em que nos submetemos a viver, do qual já nos alertava Zigmunt Bauman.

Durante mais de uma hora de conversa, o Cacique falou a nossa equipe sobre os problemas enfrentados pela comunidade, os estigmas sociais com os quais são obrigados a conviver e a luta constantemente para preservar suas terras e cultura. Mas a vida na aldeia não é feita apenas de dificuldades e sim de muita alegria, tradições, valores e conquistas, como a nova sede da escola, construída para facilitar o acesso das crianças e jovens aos estudos.

Arte na Cuca: Como a comunidade indígena se estabeleceu na região que hoje é a aldeia Tekoa Tarumã?

Ademilson: Eu sou natural do Rio Grande do Sul, e estou em Santa Catarina há mais de quinze anos. Quando cheguei nessa região com a minha família, a aldeia já existia, outras famílias já estavam aqui, isso é algo de muitas gerações. Nossa família está aqui há aproximadamente seis anos, porque é da nossa cultura mesmo, o povo Guarani se muda, as vezes porque em certos lugares já não havia mais a possibilidade de plantio, pois o solo precisa descansar e se recuperar. Algum tempo depois de chegar aqui, tive outros filhos e estou há aproximadamente dois anos exercendo o papel de liderança. Nesse período estamos construindo algumas estruturas necessárias para a aldeia, como a implantação da escola e outros meios para irmos sobrevivendo.

Arte na Cuca: Você falou a respeito de sobrevivência, atualmente qual é o principal meio de sustento da comunidade?

Ademilson: Nós temos quatro funcionários contratados pelo Estado, que tem o cargo de professor e lecionam para a própria comunidade da aldeia, mas infelizmente a maior parte de nós sobrevive de doações. E outra fonte de arrecadação de renda é o nosso coral, composto por crianças que se apresentam em escolas públicas e universidades, além de outros eventos, em troca de alimentos. Por último temos a venda de artesanatos.

Arte na Cuca: Em um momento em que o país é governado por lideranças que deixam claro a falta ou nenhuma preocupação em preservar as terras indígenas, disseminando ainda mais o preconceito e o ódio, quando menciona que “Cada vez mais o índio é um ser humano igual a nós”, quais são as maiores dificuldades enfrentadas por vocês como ancestrais dos legítimos habitantes do Brasil?

Ademilson: Não só hoje, mas desde muito tempo como povos indígenas, nós estamos sofrendo grandes dificuldades e muitas ameaças. Vivemos em estado constante de alerta e resistência, desde a época do descobrimento e da invasão dos não – indígenas.
A nossa cultura sempre foi ameaçada, inclusive nossa própria existência, então, nos tempos atuais, não faz diferença, pois continuamos vivendo esse mesmo processo de extermínio.
Nesse cenário, já aumentou a potência de sermos exterminados, somos atacados em forma de lei, com preconceitos, vivemos com muita dificuldade, principalmente por conta do processo de demarcação das terras indígenas.

Meses atrás nossa aldeia foi ameaçada, recebemos constantes ameaças até mesmo de morte, por conta da demarcação. Nossos direitos, previstos na constituição não estão sendo respeitados nem executados, vivemos um processo de invisibilidade social e na visão do governo, nos simplesmente não existimos. Essa é a pior coisa que pode nos acontecer. Nós somos seres humanos, temos a nossa cultura, língua, espiritualidade, mas mesmo assim não somos notados. Sobrevivemos no meio do fogo cruzado, pois o maior alvo está sempre em quem ocupa a liderança.

Arte na Cuca: Em um futuro próximo, como você deseja que as pessoas possam enxergar e entender a cultura indígena?

Ademilson: Sempre, desde a criação do mundo, nós sempre fomos seres humanos. Eu gostaria muito que a sociedade em geral nos enxergasse como seres humanos normais, como qualquer outra pessoa. Nós temos uma cultura diferenciada é claro, mas o sangue que corre nas veias de cada um de nós é o mesmo. Sempre tivemos capacidade, condições e possibilidades assim como os não-indígenas, de frequentar a universidade e exercer cargos de instituições renomadas. Não somos diferentes das outras pessoas.
Sonho com o dia em que a sociedade em geral, aprenda a nos enxergar como pessoas, sem preconceitos, mesmo que não conheçam ou não queiram conhecer a nossa cultura. Que apenas respeitem o nosso direito de também existir. Não é preciso acreditar em tudo o que nós acreditamos, mas o mínimo que pedimos e buscamos é o respeito.

Arte na Cuca: Durante nossa conversa, você menciona alguns grupos que chegam à aldeia para visitas de estudos, ainda com o pensamento retrógrado, e entendem o indígena como aquele ser que vive isolado no meio da floresta, ou aqueles que de alguma forma não chegam com boas intenções. Como é essa situação para vocês e de que forma gostariam de ser reconhecidos quando o assunto é a pesquisa da cultura indígena?

Ademilson: A sociedade não-indígena precisa aprender a identificar que tribo indígena vive em determinada região, pois existem vários povos e várias etnias. Nós somos da etnia Guaraní, e sempre habitamos o litoral brasileiro e na maioria das vezes, quando escutamos assuntos que tratam de uma etnia, nos tratam apenas como “índios”, não sabem se é Kaingang, Xokleng, Guaraní, ou outros. Sendo que somos muitos e cada etnia tem sua cultura e forma de conviver. Para nós, o mais interessante seria que as escolas e demais instituições obtivessem informações mais detalhadas e tentassem de alguma forma identificar quem são os povos indígenas, em que situações são distribuídos, quais as etnias existentes.

Arte na Cuca: Ao passar pelos grandes centros das cidades, é possível perceber mulheres indígenas vendendo seus artesanatos em calçadas. Muitas chegam até a serem confundida com moradoras de ruas, e que estão na situação de pedir esmolas. Como é para vocês este não-lugar na sociedade?

Ademilson: É normal essa definição social, pois nós indígenas estamos nessa estatística de exclusão, assim como os moradores de rua. E é com essas condições que nós somos invisibilizados, realmente excluídos. Mas, eles não sabem que nós somos um povo diferente, somos indígenas, temos nossos valores, crenças e culturas. Estamos apenas comercializando nossos produtos, e o que as pessoas não observam é que quando um artesão indígena está ali vendendo suas produções ele está trabalhando. É triste termos que passar por isso, pois buscávamos nosso sustento na mata, com a destruição da natureza, precisamos partir para a mata de pedra, que são as cidades e então mendigar. Isso nos deixa profundamente tristes.

Arte na Cuca: Cacique, percebemos algumas construções na região da aldeia, vamos falar sobre os projetos que estão em andamento? Quais são eles e como as pessoas podem colaborar?

Ademilson: Estamos construindo a Casa das Mulheres, que é uma iniciativa em apoio com a Rede Luz, instituição que tem sido um grande braço direito da aldeia. É um espaço específico para o atendimento das mulheres e suas atividades, o projeto está no início, mas a comunidade e as mulheres da aldeia estão muito envolvidas no andamento da construção.
Também temos a extensão da escola estadual, que apesar de estar passando por um processo burocrático, estamos conseguindo trazê-la, sendo que a sala foi construída pela própria comunidade com materiais cedidos por parceiros. Temos aproximadamente 20 alunos, divididos em ensino fundamental, EJA Médio e o Pró-Jovem.

Quem quiser conhecer ou ajudar os projetos da aldeia Tekoa Tarumã, pode entrar em contato com Luiz, da ONG Rede Luz, através do número (47) 9 9923-4219.