“Dançando na rua” quer agitar o calendário da dança em Joinville

Realizado nos últimos domingos de cada mês na Rua das Palmeiras, o projeto “Dançando na rua” promove neste dia 27 de maio a sua segunda etapa. A iniciativa pretende agitar a dança joinvilense ao longo de todo o ano e mobilizar um cenário que parece ganhar visibilidade apenas em julho, durante o festival. O Arte na Cuca conversou com o bailarino, professor e produtor Jailson Cordeiro, um dos organizadores deste projeto que tem o apoio do Sistema Municipal de Desenvolvimento pela Cultura (SIMDEC).

Vamos começar falando sobre você. Quem é Jailson Cordeiro? Qual é a sua história?

Uma pessoa que encontrou seu propósito na arte, na cultura e na educação. Alguém que tenta mudar as pessoas usando como ferramenta a cultura e a arte, principalmente a dança. Comecei a dançar em 2008, com a dança de salão. Estudei bastante, fiz vários cursos e congressos fora de Joinville e fiz o curso de formação de professor em dança de salão. Em 2014, comecei a trabalhar na área de produção cultural. Desde aí me senti mais à vontade na área e finalizei a especialização em Gestão Cultural em 2016. Em 2015 comecei a lecionar no Colégio Elias Moreira para o curso de Jovem Aprendiz e foi quando minha vida passou a tomar um propósito com mais sentido ainda. Estar em sala de aula é uma das minhas paixões, assim como a dança. Em 2017 comecei a fazer parte da diretoria da Associação de Grupos de Dança de Joinville (Anacã) como secretário e neste ano renovei o mandato por mais dois anos. Temos uma evento magnífico, que é o “Dança Joinville”. Concomitantemente, estou finalizando a segunda especialização, que é em Neuroaprendizagem. Este ano, depois de muito tempo, consegui colocar em prática um dos sonhos mais antigos que é o “Dançando na rua”.

Qual o objetivo do “Dançando na Rua”?

Entendemos que a dança sofre um processo inverso hoje: a dança vem da rua, da cultura popular, dos anseios das pessoas. Hoje em dia, faz dança quem vai para as escolas fazer aula, para aprender o passo certo ou errado. Não condeno escolas de dança, muito pelo contrário: minha intenção é e sempre foi fomentar público às escolas, mas o “Dançando na rua” tem esse desejo de levar as pessoas a sentir o que é dança (naquilo que eu acredito), ser sua essência para todos. Além disso, queremos fazer valer o título de Cidade da Dança. Joinville tem o maior evento do mundo no gênero, mas as pessoas da cidade precisam dançar. Acreditamos que o projeto evidencia uma das maiores identificações da população com a cidade.

O projeto terá mais sete edições. Todas elas serão na Rua das Palmeiras?

Sim, todas as edições serão na Rua das Palmeiras. Escolhemos a Rua das Palmeiras como local principal, exatamente por ter um vínculo muito forte com a cidade. A identidade da cidade é intrínseca à Rua das Palmeiras e à dança.

Quem está por trás deste projeto?

A idealização foi minha. Penso nele desde 2014, mas conto com o apoio de outros dois professores que estão comigo desde o início, inclusive como proponentes junto ao SIMDEC, que são Fábio Simões (de dança de salão) e Jhon Helder (de danças urbanas). A produção cultural ficou por conta de minha empresa, a Mais Cultura Gestão Cultural. Temos também como apoiadores um designer que é o Marcelo Oliveira e uma parceria para alguns vídeos com a Dutra Filmes.

Como é a rotina de ensaios de quem trabalha com dança?

Temos vários perfis de profissionais de dança. Tem aqueles que são donos de escolas ou de grupos de dança, aqueles que lecionam em várias locais ou escolas diferentes, aqueles que não trabalham somente com dança, enfim, vários perfis. Creio que a maior dificuldade esteja na trajetória até você se tornar profissional de dança. Não existe regulamentação ideal para a área. Existe muito preconceito também com quem escolhe seguir na área, o que gera desconfiança e falta de credibilidade. Quem nunca teve de ouvir a frase, “você só trabalha com dança?”

Além do “Dançando na rua”, tens algum outro projeto, curso ou apresentações futuras para Joinville?

Tenho vários. Temos o “Dança Joinville”, que já é uma mostra consolidada, com quase dez anos de história, para quem estamos dando um novo rumo a partir deste ano. Temos também algumas ideias na gaveta, como o “Festival de danças urbanas Urban Cult”. Tenho projetos também em outras áreas além da dança, que são a “Biblioteca de muro” – que são bibliotecas abertas à população que ficam em muros de casas – e também o “Poemas em código”, que utiliza a tecnologia do QR Code para democratizar o acesso à poesia. Existem muitas outros projetos que as pessoas me procuram para dar uma ajuda ou orientação. Estou sempre aberto a conversas.

Deixe uma mensagem aos leitores do Arte na Cuca.

Quero agradecer a todos que fazem parte do Arte na Cuca e agradecer aos leitores porque tenho certeza que sem eles a ideia não existiria. Quero dizer que o trabalho com dança na cidade ainda é muito longo e está longe do ideal, mas tem pessoas que querem fazer de Joinville, de fato, a cidade da dança. Ao leitor que tem este desejo, venha fazer dança na cidade – seja no meu projeto ou com outros profissionais da área. A dança pode transformar as pessoas, pode alavancar o setor criativo, o econômico e muito mais. E, claro, esperamos todos na próxima edição do “Dançando na rua”, que acontece no último domingo de cada mês às 15 horas na Rua das Palmeiras. A próxima edição já é neste domingo, dia 27 de maio.

Arte na Cuca entrevista o cantor Jesus Luhcas

SHOW DE LANÇAMENTO DO CLIP PODE ME CHAMAR DE BIXA

ONDE: Galeria 33 (R. Bento Gonçalves, 33, Glória), em Joinville

QUANDO: Sábado (12 de maio), às 18 horas

QUANTO: R$ 15 antecipados e R$ 20 na hora. Ingressos disponíveis em sympla.com.br/sounina.

 

O cantor e compositor Jesus Luhcas, maranhense, 24 anos, deixou São Luís há seis anos para vir atrás de um amor que veio morar em  Joinville. Por aqui também encontrou sua maior paixão, a música. O artista estará lançando o novo clipe da canção “Pode me Chamar de Bixa” neste sábado na Galeria 33. O clipe foi gravado no Hotel Trocadero nos dias 9 e 10 de março e envolveu uma grande equipe de profissionais entre cinegrafistas, bailarinos, produtores e técnicos. A equipe foi encabeçada pelo diretor paulista Mário Águas e pelo diretor de arte Monteiro Monteiro, da produtora WTF. A maior parte da equipe, que incluía estudantes de Cinema da Unisociesc, trabalhou de forma colaborativa. Em breve, o clipe “Pode me Chamar de Bixa” será lançado em São Luis, cidade natal do cantor. Nesta entrevista Jesus Luhcas nos contou sobre como surgiu a ideia para seu novo trabalho, o que ele está curtindo no cenário atual da música e muito mais. Confira!

 

Quem é Jesus Luhcas?

A melhor definição é humano, porque o tempo todo a gente está mudando. Esse videoclipe que vou lançar agora é muito diferente do primeiro videoclipe que eu lancei da música “E eu” que eu fiz com o Xuxa Levy. Naquele primeiro clipe eu estava em uma fase de autoconhecimento, de percepção do mundo, do que realmente vale a pena e isso tudo vai mudando com o tempo. Eu cito sempre a música do Raul Seixas “Metamorfose Ambulante”:  “se hoje eu sou estrela, amanhã já se apagou, se hoje eu te odeio, amanhã lhe tenho amor, lhe tenho amor, lhe tenho horror, lhe faço amor, eu sou um ator”. O que mais me atrai dentro da arte é poder explorar essas diversas facetas. Comecei cantando em um coral da igreja, então as minhas raízes musicais de fora da igreja, são do rock brasileiro, Renato Russo, Cazuza, Cássia Eller e Raul Seixas. “Pode me chamar de Bixa” é pop, mas tem uma boa pegada rock ‘n’ roll. Uma coisa que eu não abro mão é deixar uma mensagem positiva, algo que some na vida das pessoas, e não simplesmente uma música que vai fazer as pessoas dançarem. Tem que trazer um tipo de pensamento, critica, transformação da mente mesmo. Essa é a minha definição.

 

De onde você veio e por que escolheu Joinville para seguir sua vida?

Quando eu fazia parte do coral, eu me apaixonei por uma menina de São Paulo que veio morar aqui em Joinville. Não demorou muito eu vim atrás dela, com esperança de termos um relacionamento amoroso, que nós temos, sempre tivemos, desde que nos conhecemos. Somos bastante amigos e eu digo que ela não foi o grande amor da minha vida, mas eu encontrei um grande amor aqui em Joinville, que é a grande paixão da minha vida, a paixão pela música. Fui bailarino dos nove aos 18 anos, quando eu vim pra Joinville, cidade da dança, eu achei que iria trabalhar com dança, mas descobri aqui a paixão pela música. Cheguei aqui em Joinville no dia 16 de maio de 2012.

 

Como foi seu início na música e quem te inspirou no início da carreira?

Eu iniciei cantando no coral, ainda na escola, mas antes disso eu ganhei um violão de um amigo e esse presente foi meu companheiro. Aprendi a tocar violão sozinho e quem me inspirou, musicalmente falando, é um cara chamado Marcos Almeida. Ele não é muito conhecido, mas eu amo muito o trabalho dele. Ele é um cantor gospel, mas com uma pegada completamente diferente desses cantores que a gente está acostumado a ouvir. A música tem um poder de tocar, geralmente o que me toca é a poesia, a letra, a ideia por trás, e esse cantor tem músicas com conteúdo de reflexão. As pessoas precisam escutar Marcos Almeida.

 

Quem te incentiva e qual é a sua inspiração para continuar na música?

A nova cena musical é maravilhosa, o Brasil está em uma de suas melhores fases musicais, nós temos nomes que ainda são pouco conhecidos, que eu acredito que são nomes que só tendem a crescer dentro do cenário musical. Começamos a descobrir nomes como Liniker, AnaVitória, Francisco El Hombre, Pablo Vittar, que é um artista verdadeiro, que está fazendo muito mais que música, ele está fazendo uma transformação de mentalidade, de posicionamento político, inclusive. E artistas de Joinville eu tenho escutado muito a banda Napkin, Fevereiro da Silva, Ana Paula da Silva, Mario Ghanna. Tem uma galera muito boa aqui em Joinville.

 

Qual é o seu objetivo na música?

Viver de música e ser rico! Já teve momentos que eu cheguei a pensar que ser rico seria uma coisa ruim, mas hoje eu quero ter dinheiro porque o meu objetivo com a música é futuramente abrir escolas de artes, porque a arte mudou a minha vida, a arte me trouxe para um posicionamento pessoal de me reconhecer como ser humano individual, que tem desejos, histórias e isso tudo foi permitido através da arte. Tudo o que eu sei de arte, ganhei gratuitamente, estudei em escolas de dança, teatro, canto, tudo de maneira gratuita, e o que eu mais quero é proporcionar uma história melhor do que a minha para outras pessoas, outras crianças, adolescentes. A arte tem o poder de transformar e abrir a mente, libertar as pessoas de prisões que estão dentro da nossa cabeça. Aqui em Joinville eu já estou apoiando um lugar incrível chamado Centro de Transformação Cultural Arte Para Todos – IMPAR. Este trabalho que eu estou fazendo lá no Arte Para Todos, já é o meu flerte com o meu grande sonho.

 

De onde surgiu a inspiração para “ Pode me Chamar de Bixa”?

Eu estava indo participar de um concurso chamado “Cidade que dança”, eu tenho um estilo próprio de me vestir, estilo que eu escolhi. Quando percebi um carro diminuiu a velocidade, baixou o vidro e um cara gritou “bixa!”, eu olhei pra ele e disse:  “Oi, sou eu tudo bem?”, ele ficou sem reação, pois a intenção dele foi me ofender. Eu não tenho preocupação com sexualidade, sou bicho solto, eu apoio a causa LGBT porque eu sou gay quando eu quero ser gay, sou bi quando eu quero ser bi e hétero quando quero ser hétero. Sexualidade não é da conta de ninguém, eu é que tenho que dar conta da minha sexualidade, ninguém tem que se incomodar com isso. Muitos meios de comunicação não quiseram entrar nesse projeto porque ainda existe o estereótipo de que a palavra “bixa”, é uma coisa ruim, eu vejo que é necessário falar desse assunto tanto pelo fato de o cara ter me parado no meio da rua e usado a palavra para tentar me ofender, quanto pelo fato de que depois eu comecei com o projeto, ter ouvido “nãos” por conta dessa palavra, e é nesse momento que eu sei que tenho que seguir com o projeto. E outra: pode me chamar de bixa, sim!

 

Quando será o lançamento do álbum?

Em 20 de julho lançarei o EP em um show que vai acontecer aqui em Joinville na Lime Club. Esse EP vai trazer seis músicas, todas com misturas de ritmos, vai ter reggae com rap, rap com rock e pop com reggae. Gosto muito dessa mistura de ritmos.

 

Fale uma palavra que tenha grande significado para você.

Amor. É uma palavra que é banalmente usada, mas que tem um significado enorme.

 

Deixe algum recado para quem ainda não conhece seu trabalho.

Eu acho que a gente é muito distraído, todos nós. As pessoas fazem um alvoroço e enquanto está todo mundo olhando para aquele lugar, está acontecendo outra coisa escondida e nem sempre o que está acontecendo escondido é uma coisa ruim. Às vezes é o que realmente precisa de atenção, como alguns desses artistas que eu citei, que não são muito conhecidos. Existem artistas na mídia que são conhecidos e que são maravilhosos como Anita, Pablo Vittar, Simone e Simaria, Maiara e Maraisa, Luan Santana, todos estes grandes artistas nacionais reconhecidos, fazem um trabalho lindo, mas as pessoas precisam se atentar que existem outros artistas muito bons, nossa cultura é linda, temos outras fontes de arte tão boas. O recado é: se esforcem para não ficar comendo apenas aquilo que estão te dando, vivendo aquilo que estão te oferecendo. Sejam protagonistas das suas vidas!

ANC entrevista: Denise Torrens Nunes

Foto por: Walmer Bittencourt Junior

Dedicada, determinada, mulher, mãe, esposa, artista, arteterapeuta e arte-educadora, Denise Torrens Nunes é tudo isso e muito mais. É alguém que sabe o que quer e corre atrás dos seus objetivos. Na entrevista que concedeu ao ANC falou sobre carreira, seu ateliê novinho em folha e principalmente sobre a descoberta de uma paixão: A arteterapia.

ANC: Como iniciou seu primeiro contato com as artes?

DENISE: A história é bem longa…(risos). Foi a partir das aulas da Casa da Cultura “Fausto Rocha Júnior”, quando resolvi fazer o  curso de cerâmica, paixão a primeira vista. Fiz o curso regular de três anos as aulas de cerâmica na modalidade ateliê, além de outros cursos, como o de porcelana, desenho, pintura, história da arte e tecelagem. Inclusive participei de um grupo de estudos em história da arte.

Vida que segue, trabalhei por muito tempo com a confecção de lembrancinhas para todos os tipos de ocasiões. Mas sempre envolvida com arte, montei um ateliê de festas, trabalhava com festas temáticas e lembrancinhas mas a coisa chegou a tal ponto que no final já fazia a festa completa, decoração, montagem, lembrancinhas e alimentação. Isso aconteceu até o momento em que falei para mim mesma que queria voltar a estudar e fazer curso de arte. O primeiro filho já estava criado e eu tinha mais tempo para mim, o ano era 1998.  Como eu já tinha a graduação em história, não precisaria fazer vestibular para iniciar um novo curso, naquele ano a FURJ estava mudando para UNIVILLE. Nessa empolgação toda, descobri que estava grávida do meu segundo filho, então dei mais um tempo, não era o momento certo.

Meu segundo filho nasceu prematuro e tivemos algumas complicações, meu bebê precisava de mim, da minha energia e presença, não consegui me dedicar as artes durante esse período e fiquei seis meses vivendo a experiência de ser mãe. Depois disso, tomei coragem para seguir outro rumo, uma fase de mudanças. Vendi todo o meu estoque de material para trabalhar com festas e terminado todo esse processo que foi cuidar do meu filho e de mim mesma, novamente coloquei em minha cabeça que eu queria me envolver ainda mais com arte, até que surgiu um curso de designer de interiores em Joinville – fui fazer o curso, me formei e trabalhei muitos anos na profissão, mas ainda não era a arte que eu tanto buscava.  

Mesmo trabalhando na área de design, não abandonei a cerâmica, sou associada da AAPLAJ (Associação dos Artistas Plásticos de Joinville) e participo do NAF (Núcleo Arte do Fogo), que é um grupo de ceramistas que se reune uma vez por semana e trabalha a argila, cada qual com sua poética, dentro de sua perpectiva artística, mas com trocas de experiências e muito empenho em prol da arte. Depois de todo esse tortuoso caminho, finalmente fiz artes visuais, emendei uma especialização em arteterapia, que me rendeu uma nova carreira profissional. Hoje posso dizer que estou realizada,  estou trabalhando em meu ateliê com cerâmica, tecelagem e ministrando aulas e ainda sessões de arteterapia.

 

ANC: O que te motivou a pesquisar e  a buscar formação em arteterapia? Nos conte um pouco mais a respeito.

DENISE: Acredito que  a arte faz parte da vida de todos nós. Vi na arteterapia  a junção de várias motivos para usar da arte como meio de transformação. O arteterapeuta trabalha com algo muito importante, o poder de criar.  Se baseia em várias formas de expressão artística com finalidade terapêutica .Sempre tive curiosidade sobre como a arte pode ajudar no autoconhecimento de cada pessoa.  A expressão artística pode revelar sentimentos e emoções muito profundos, pode ser aplicada a todos os públicos, de crianças a idosos. Meus público alvo no momento é justamente o idoso institucionalizado.  Após terminar o estágio da especialização, que fiz em um lar de idosos fui contratada para atuar junto a esse público. Num primeiro momento trabalhava apenas como arte educadora (pois ainda não estava formada) e agora já atuando  como profissional arteterapeuta. Confesso que estou me realizando, juntei minha paixão antiga com uma nova. Ser arteterapeuta é cuidar terapeuticamente por meio da arte.

É muito importante perceber como se pode fazer a diferença, principalmnete quando se trabalha com um público carente de atenção e afeto, que muitas vezes se considera a margem do convívio social e familiar. Foi um começo difícil, entre os idosos existia um certo preconceito,  ouve-se muitos comentários que desenhar e pintar é “coisa de criancinha” Mas com muita paciência e dedicação os resultados aparecem, cria-se um elo de confiança entre arteterapeuta e atendido que faz a diferença para o processo caminhar.

ANC: Com a finalização da especialização e do seu projeto de estágio, os grupos que você acompanha/atende  continua o mesmo?

DENISE: Tenho dois focos de atuação, um deles é no meu ateliê, onde atendo todo e qualquer público, trabalho com aulas de cerâmica, tecelagem e agora já formada e regulamentada como arteterapeuta, posso associar as aulas que mencionei com a arteterapia em ambiente de ateliê, pois ambas são modalidades muito expressivas e altamente terapêuticas, como também trabalhar somente com a arteterapia ,assim como outras formas de expressão artística. Cada atendido é único e ele define por qual processo quer passar, mas todas as pessoas que iniciam nas sessões de arteterapia preferem ficar trabalhando dentro desse contexto terapêutico no ateliê. Mas é livre e negociável, como fica melhor para cada pessoa.

 O segundo foco de atuação é no lar de idosos onde trabalho três vezes por semana. Atendo os idosos que já participavam do estágio bem como todos os outros, pois muitos são acamados e eu faço uma adaptação para fazer acontecer o processo arteterapêutico igualmente a todos.  Quando se trabalha com idosos tudo deve ser adaptado , desde o usos de materiais até a sessão propriamente dita. A participação é voluntária, hoje quando chego no lar para trabalhar não preciso mais passar de quarto em quarto para solicitar a participação dos idosos, normalmente já estão esperando  em uma ansiedade visível ,para fazer aula de artes, como eles gostam de falar. As atividades são dinâmicas e quase sempre bem aceitas, não gostam de alguns tipos de materias, como a argila, que eu particularmente como ceramista, gostaria muito de trabalhar, mas não funciona e quando quero trabalhar com modelagem, uso outros tipos de massa, é assim que se faz as adaptações, massa de sal, massa de trigo para fazer bolachinhas são ótimas para explorar aspectos do inconsciente, trazendo a tona um conteúdo que está muito bem guardado, é um conteúdo sombrio  nem bom nem ruim, que pode e deve ser resignificado em uma nova roupagem, promovendo a cura interior de cada um.

As linguagens mais aceitas por eles são desenho, pintura, recorte colagem e culinária, todos gostam muito.   O grupo as vezes sofre perdas, sempre estou competindo com indisposições, consultas médicas, visitas inesperadas entre outros fatores. Mas a participação é sempre voluntária, só assim com boa vontade que se consegue chegar  aos conteúdos que o insconciente reserva. Também fazemos passeios com os internos, todos os que tem condições de sair são convidados, é quase uma aventura em meio a cadeiras de rodas e andadores, mas uma experiência muito significativa para todos. Visitamos recentemente a exposição em que eu participei na AAPLAJ (“Memória de moças bem-comportadas” – 2018).

Na sua grande maioria os idosos nunca foram a uma exposição, ao cinema, ou ver o mar, ou mais simples ainda alguns deles nunca tinham usado lapis de cor, giz de cera – nem conheciam. Foram apresentados no momento do meu estágio. Eu uso muito material reciclado, eles ficam admirados quando eu falo que vamos pintar com pincel diferente, um pincel feito por eles, é muito especial, pois cada um consegue acreditar no seu potencial, dentro do seu contexto, e eu na função de arteterapeuta apoiando essa descoberta. Émuito gratificante apresentar algo tão novo, tão simples, a quem acredita ter poucas perspectivas.  Eu aprendo muito com eles, sempre comento com o grupo.

ANC: Logo na primeira pergunta você menciona que passou por diversas ocupações e trabalhou em áreas afins, com seu trabalho como arteterapeuta podemos dizer que finalmente a Denise se “encontrou” em uma profissão?

DENISE: Ah, com certeza! Eu penso que minha relação com a arteterapia já vem de muito tempo, pois quando fazia cerâmica desde os primórdios  do meu caminho como ceramista, já tinha esse contato mais íntimo e sempre me fez muito bem trabalhar o barro que é extremamente terapêutico. A argila por si só, já é um material fantástico, vivo, respeito muito esse material,  em que você consegue trabalhar até certo ponto, depois ele (o barro) diz: Chega! Agora sou eu. E então você não consegue mais fazer somente o que quer, respeitar o tempo da argila, ter paciência para que o processo aconteça. É assim na arteterapia também.

ANC: Como é essa sua relação com o barro?

DENISE: Respeito a vontade do barro. Trabalho em uma peça até certo ponto e quando vejo que está no limite, paro de mexer . Um exemplo fácil para que compreendam minha relação com esse material, é quando abro meu forno e percebo peças que estão trincadas. Não gosto de consertar,  de arrumar, aceito o que o barro e o forno me apresentam, o que o universo me entregou. As vezes chego no ateliê, vejo que algo não ficou bom, simplesmente jogo no chão e quebro e então vai virar outra coisa. Não sofro por algo que a princípio não deu certo da maneira que eu esperava. É um processo de carinho, doação e interação – “amor e ódio”.

Foto por: Walmer Bittencourt Junior

ANC: Sobre seu ateliê, você iniciou fazendo atendimento terapêutico ou ministrando aulas de arte como estamos acostumados a vivenciar?

DENISE: Comecei somente ministrando aulas de cerâmica e tecelagem, que ainda acontecem, porém com o interesse maior na arteterapia, pois ainda estava cursando a especialização, então não tinha licença para aplicar as práticas terapêuticas, e eu ainda estava aprendendo como dar um suporte emocional a pessoa que busca uma sessão. Sempre fui e continuo muito ética. É preciso trabalhar de maneira muito consciente e cuidadosa, zelosa por todo o conteúdo que o atendido confia ao arteterapeuta,  pois muitos conflitos vem à tona. Conteúdo não verbalizados e expressos nos desenhos, nas pinturas, e em todo o tipo de material que disponibilizo. Falar não é necessário, pois muitas vezes verbalizar é muito difícil, um processo sofrido. Agora sim, certificada o espaço está aberto para o atendimento voltado ao lado terapêutico.

 

ANC: O que  podemos encontrar no seu ateliê?

DENISE: Encontrará um ambiente seguro, agradável  e com acessibilidade. As vezes não se sabe o que quer, mas na arteterapia somos livres para experienciar, livre  da estética, não existe feio ou bonito no contexto arteterapêutico. Toda expressão plástica é carregada de símbolos e esses símbolos após resinificados, o atendido tem condições de encontrar seu norte, seu equilíbrio.  Eu também possibilito experiências em tecelagem e argila, como aulas…mas tudo depende da necessidade e do que o atendido deseja. O meu objetivo é trabalhar o processo terapêutico rumo ao autoconhecimento, ao prazer de viver e de se cuidar terapeuticamente.

ANC: E as aulas dedicadas apenas ao ensino das práticas artísticas?

DENISE: Atendo em horários diferentes para cada situação. As aulas e as sessões podem ser em grupo ou indivdual, tanto a arteterapia quanto as aulas que visam apenas o ensino de alguma modalidade artística.

ANC: Como acontecem essas sessões? O aluno participa de aulas experimentais?

DENISE: A pessoa pode fazer uma aula ou uma sessão experimental, ou as duas situações.

ANC: Você também recebe crianças para sessões de arteterapia?

DENISE: Sim. Trabalho com todos os públicos.  O lúdico é muito explorado, a criança não tem preconceito, gosta de todos os materiais, lógico salvo em situações específicas de doenças  ou qualquer outra advesidade, mas tudo sempre pode ser – e é adaptado.

ANC: E quanto ao investimento e materiais?

DENISE: Vai depender do que a pessoa  procura e quer. Cada situação tem um valor, aulas de tecelagem tem um valor de mensalidade e taxa de material, a pessoa não precisa trazer nenhum material, tudo está a disposição no ateliê. Já a cerâmica tem igualmente um valor de mensalidade e a pessoa fica livre, pode comprar a argila e outros materiais no ateliê, e usar suas ferramentas, como pode usar as ferramentas que são disponibilizadas, queimas são cobradas separadamente. Trabalho com pacotes específicos para cada situação.

Foto por: Walmer Bittencourt Junior

ANC: Quantas pessoas  é possível atender no ateliê atualmente?

DENISE: Posso atender grupos de 05 pessoas por sessão/aula, em todas as modalidades.  Além de ministrar aulas individuais se for da vontade do cliente.

ANC: E quanto aos horários das aulas e das sessões?

DENISE: As aulas  acontecem segundas das 08:30 as 11:30 e as terças das 08:45 as 11:45 hs. Para tecelagem e cerâmica respectivamente.  Para atendimento em arteterapia é agendado previamente. Porém os horários podem sofrer alteração conforme a necessidade.

ANC: Queremos saber um pouco mais da Denise artista, como está esse seu outro lado?

DENISE: Fiz minha primeira exposição individual em 2012, na AAPLAJ, participando do projeto “Lançamentos”, na época coordenado pela artista Linda Pool e que contou com a curadoria de Miriam da Rocha. Participo ativamente da associação, faço parte do NAF – Núcleo Arte do Fogo da AAPLAJ, que se encontra semanalmente, cada artista produz dentro de sua poética, mas as trocas de experiências entre as ceramistas são constantes. Uma vez por ano temos a exposição do grupo, nesse ano será em novembro, já comecei as pesquisas para essa exposição, atualmente sou a cordenadora do NAF na gestão 2018/2020.

Já na tecelagem desenvolvo tecidos com a interferência de materiais que podem conversar entre si, fios, lã, barbantes, e tudo a mais que pode servir para tecer.  Minha produção vai de carteiras de mão, bolsas, passando por vestuário, entre mantas, echarpe, chalés,são todas peças exclusivas. Mas no momento meu coração bate mais forte com e pela arteterapia. Porém, não consigo ficar longe da cerâmica e da tecelagem, sou muito inquieta, sempre procuro produzir mesmo que peças pequenas, é uma necessidade, funciona como minha terapia e me fortalece. Atualmente como artista, estou participando das exposições coletivas que acontecem na AAPLAJ em destaque a mostra que está sendo exibida no galpão da associação, a exposição “Proibido para menores de 18 anos – Favor não insistir. ”

ANC: Seu trabalho é sempre figurativo ou tem peças que seguem para a linha do abstrato?

DENISE: Depende muito do momento, mas minhas peças não são obras de grande porte, produzo peças em cerâmica de porte médio a pequeno,  não é um trabalho robusto, é mais rústico que delicado, mas gosto de interferir com materias diferentes e inusitados. Não existe peça com defeito, sim com efeito, me desafio cada vez que uma peça sai do forno com uma trinca ou uma esmaltação que não saiu como o previsto. É sempre uma surpresa abrir o forno e se defrontar com o resultado. Já tive muitas fases,  mas meu fio condutor é único, me vejo nas minhas peças, mesmo quando trabalho uma encomenda.

ANC: Para finalizar nossa entrevista queremos saber sua opinião sobre o espaço que a cerâmica e os ceramistas tem dentro das instituições de arte da cidade? (Vale locais alternativos).

DENISE: É ainda muito difícil. A cerâmica é uma arte que requer muitos cuidados na hora de produzir, pois o processo é longo, as peças demoram  para ficarem prontas. Além do que podemos perder todo o trabalho a qualquer momento, passar por duas ou mais queimas a altas temperaturas. Na hora de expor, também requer cuidados.  São peças sensíveis, existe uma preocupação em relação ao suporte, e onde serão expostas. E por fim existe ainda um preconceito em relação ao material, as pessoas desconhecem o valor da argila, desvalorizando a obra de arte feita de barro.  Os espaço são ainda escassos e muitos não apoiam a cerâmica como arte e sim apenas como artesanato, inviabilizando a exposição das obras.